A composição do GLP praticamente não afeta a eficiência da queima

O engenheiro, doutor em Energia pela USP e consultor da Ultragaz Fernando Cörner da Costa elaborou um paper  que trata de uma questão que preocupa muitos consumidores empresariais: as variações da composição do GLP e as possíveis consequências na regulagem dos queimadores. Em entrevista sobre seu trabalho, Cörner esclarece essas questões e desfaz mitos.

Conheça o paper “Composições do GLP e comportamento de queimadores”

Por que existem variações significativas da composição do GLP no Brasil?

A composição do GLP varia por uma série de fatores, como a origem da matéria-prima (petróleo cru de diferentes composições, ou como “umidades” presentes no gás natural bruto), processamento em diferentes refinarias ou GLP importado.

Seria possível padronizar uma composição bem mais rígida para o GLP?

Não há dúvida que falando apenas tecnicamente sim, isto seria possível. Mas certamente acarretaria em uma menor disponibilidade de GLP. A limitação das tancagens nas refinarias, aguardando a possibilidade de corrigir as misturas para a almejada faixa “padrão”, poderia acabar muitas vezes na queima em “flare”, acarretando na elevação do custo do GLP. De forma análoga, isso limitaria também algumas importações e a compra de alguns produtos sazonalmente baratos, como butanos/butenos de países durante climas frios, que ajudam a baixar o custo médio do gás.

O que o levou a elaborar esse artigo com essas informações?

Meu dia-a-dia é lidar com as “encrencas” dos clientes industriais, pois quando ocorre algum problema o GLP é sempre o primeiro suspeito a ser acusado. E eu garanto que, quase sempre, injustamente. Como o gás apresenta a vantagem de exigir um baixo índice de manutenção, tanto preventiva como corretiva, os consumidores acabam por esquecer da sua necessidade. Além disso, sistemas de queima comandados manualmente sempre correm o risco de o operador praticar seus vícios. Frequentemente vejo, na mudança de turno, cada operador praticar a “sua” regulagem do queimador. E a mudança para a prática adequada não é nada fácil de ser culturalmente implantada.

Quais as dúvidas identificadas no mercado que esse trabalho visa esclarecer para o consumidor empresarial?

Muitas vezes as dúvidas surgem quando o cliente toma conhecimento das variações na composição do GLP. Mas eu sempre digo que, se ocorre algum contratempo com gás mais pesado, a causa é a instalação e não o gás. Tenho até uma “pegadinha” quando dou aulas: mostro um slide com a foto de um fogão ou aquecedor doméstico numa avaliação de desempenho, com uma chama lindamente azul e pergunto aos alunos: esta chama é de propano ou butano? Todos sempre respondem: Propano, claro. E eu digo: não, este gás padrão é quase 100% butano… Por esta razão resolvi escrever o artigo para comprovar junto aos consumidores empresariais que as variações da composição do GLP influenciam muito pouco nos resultados.

Quais são as relações entre a mistura de butano e propano e a eficiência da queima? 

Meu artigo comprovou que, mesmo variações significativas na composição do GLP, pouco alteram a eficiência da queima devido a um fenômeno físico que compensa a variação significativa entre o poder calorífico do propano e do butano com as diferentes densidades destes componentes. E tal descoberta foi feita por Robert von Wobbe em 1926, há quase um século.

Há motivos para preocupações?​​​​​​​

Não há motivos para preocupações desde que sejam atendidas as exigências das normas técnicas e de uma manutenção preventiva adequada.

De acordo com a proporção da mistura entre propano e butano, pode haver diferenças de pressão interna (no vaso de pressão). Isso é um problema? Por quê?

As proporções butano-propano influenciam significativamente as pressões internas dos recipientes (vasos de pressão). Mas isso não é nenhum problema. Nem para a integridade dos recipientes, que suportam pressões muito superiores e, além disso, dispõem de dispositivos de alívio caso ocorram pressões anormais – como no caso de incêndio nas proximidades. Nem para a vaporização natural, quando esta é utilizada, pois o dimensionamento por esta característica deve levar em conta a hipótese do abastecimento com um gás mais pesado. Nem para a pressão de utilização, que em quase a totalidade dos casos é da ordem de poucas dezenas de milibar, onde mesmo um GLP rico em butanos apresenta uma pressão disponível no recipiente superior a 100 vezes mais elevada. O único detalhe que exige atenção é quando se aplica um GLP pesado em clima frio, pois poderia ocorrer a recondensação do gás na rede interna de distribuição. Mas isso está previsto nas normas da ABNT para as redes de distribuição residenciais e não residenciais, limitando seu valor máximo e advertindo para a adoção de pressões inferiores caso necessário.

É possível substituir o gás natural pelo GLP com a mesma eficiência? Em quais situações?​​​​​​

Sim, é possível substituir o GN por GLP desde que seja feita a devida conversão, por se tratar de gases de diferentes famílias. O GN é da segunda família enquanto o GLP é da terceira família. As eficiências de ambos os gases são praticamente as mesmas e a prova disso está relatada nas tabelas do INMETRO, nas quais pode se comparar os rendimentos de fogões e aquecedores de água. Cada marca/modelo, em quase a totalidade dos casos, apresentam os mesmos rendimentos com ambos os gases.

Conheça o paper “Composições do GLP e comportamento de queimadores”